segunda-feira, 24 de janeiro de 2022

POEMAS DE UMA VIDA DE JOÃO CARLOS ROSA




" ...a melodia chega antes,

a letra chega mais tarde."






SÉRIE: PENTALOGIAS POÉTICA
LIVRO: UMA VIDA EM VERSOS
AUTOR: JOÃO CARLOS ROSA
EDITORA: TXAI EDITORAÇÕES

 
A sensibilidade poética de João Carlos Rosa vem de muito tempo, assim como sua militância pastoral e social. Ele é o poeta idílico que nos faz recordar dos tempos de roça e labuta. Dos tempos de plantações e rebanhos. E traz todos os trejeitos dos pastoreios para expressar seus sonhos e sua luta, mas acima de tudo a sua fé em Deus e em dias melhores.
 
Através dos cinco poemas retirados da sua primeira obra impressa, realizada com os recursos da Lei Federal nº 14.017/2020, denominada Lei Aldir Blanc, por intermédio da Secretaria Municipal de Cultura de Mutum, Minas Gerais, buscamos mostrar para o leitor como fé, sonho e apropriação da realidade traduzem-se em versos pelas mãos de João Carlos Rosa e nos faz lembrar de outro Rosa, o Guimarães da prosa.   
 

 
VAQUEIRO RETIRANTE
Na noite escura
Do não me toques
Caminho na solidão
Como um vaqueiro cego
Que aboia boi na imaginação
O vento dança com os ramos
Afligindo o meu coração.
 
Sou um pobre vaqueiro retirante
Que atravessa todo o sertão
Em busca de água pura
Que cura toda paixão
Pois olho para os olhos profundos
Bem no fundo do coração.
 
Amanhã é certo
Que anoitecerá chovendo
Aumentando a escuridão
E o vaqueiro cego
Continuará aboiando
Boiada na imensidão
E o canto da ave de rapina
Que chegará em forma de oração.


A CASA
A casa fica longe
Onde não chega o aluguel
Mas chega a paz
É onde a melodia chega antes,
A letra chega mais tarde.
 
A noite aqui chega
Trazendo seu não
E os seus mistérios
Quando passa a madrugada
Chega a aurora
Tudo é desvendado
Com o sol que vem outro dia
Eu, sem tempo de sofrer.
 
E na hora santa do almoço
Na mesa farta da varanda
No fogão de lenha
Com gosto de panela de barro.
 
A casa fica bem longe
Cheia de buracos
Nas paredes de barro
Não acredito nem um pouco
Nas crendices deste lugar.
 
Aqui fica tão longe
Onde não chega o aluguel
Mas chega a paz
Onde a melodia chega antes
A letra chega mais tarde.

PAIOL
Eu resolvi pensar em nós
De barbas brancas já envelhecidas
Na festa de outro dia
Como nossos casos de ontem
Com dúvidas e dívidas
Armazenados no paiol da vida.
 
Ontem nós todos juntos
Com nossas vastas cabeleiras
Sem limite e sem basta
Chamados de jovens rebeldes
Andamos com calças apertadas
De boca de sino
E sapatos cavalo de aço
Sem medo do paiol da vida.
 
Hoje nós de cabelos brancos
Sem contar os que perdemos
Muitos de barrigas crescidas
Com medo do colesterol
Não degustamos hoje
Os mesmos pratos
Das festas daqueles dias
Todos assustados com o infarto.
 
Somos chamados de pai
Outros de avô
Vamos acumulando pontos
Na corrida do tempo
Com essa sabedoria divina.




MEU POÇO
Eu me lembro
Dos encantos da minha infância
Tenho na lembrança
O meu poço verde
Que o tempo secou.
 
Meu tempo de menino
Com o poço passou
Sem eu compreender
O que é sofrer
O que é a dor.
 
Eu vejo a areia branca
Um marco forte
Onde o poço verde existiu
Um dia quando criança
Com a vida eu brinquei.
 
Agora eu rastejo
Até seus pés
E mergulho no fundo
Do tempo que não volta.
 
A minha vida torta
Como as águas que correm
Pobre e poluída
Fraca e desnutrida
De nascentes desnudadas
Que passam no meu poço verde
Que um dia fui um rei.
 
Eu me lembro
Dos encantos da minha infância
Estão todos guardados
Nas paredes de barro.
 
As lembranças que não esqueço
Do meu poço verde
Que fez de mim
Um pensador torto
Dentro do meu ser
Assim tudo continua
O meu poço verde
Ainda está morto.
 
LIVRO DE BOLSO
Andei com fé
Nas ruas estreitas de Nazaré
Pois tinha um plano
Mergulhar no oceano
Da minha vida
E medir o tamanho da fé
Que caiba no meu livro de bolso.
 
Eu reparei em todas as ruas
Procurando sem rumo
A pequena casa escola
Que fica em Nazaré
Senti as minhas asas cortadas
Quando eu vi
Que ele tinha ido para Jerusalém.
 
Andei com fé
Nas ruas de Jerusalém
Ajudei ele a carregar o madeiro
Minha irmã enxugou seu rosto
Lembrei-me da fé
Ela não estava no bolso
Ela não cabia em mim
Na manhã da sua ressurreição.
 

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