sexta-feira, 28 de janeiro de 2022

UM MUTUENSE DE MUITO CORAÇÃO

 
Livro do escritor na Amazon

ENTREVISTA COM JOSÉ ARAUJO DE SOUZA
 
Completando a trilogia de postagens sobre o livro Operação Mutum de José Araujo de Souza, trazemos uma entrevista com o autor, alguém que gosta muito da nossa amada terrinha.
 
José Araujo de Souza nasceu em 29 de Outubro de 1945, Assaraí, pertencente hoje ao município de Pocrane, sendo que quando nasceu, tanto Assaraí como Pocrane eram distritos de Ipanema.
 
Aos dois meses de idade, seus pais Simplício Albano de Souza e Geracy Araujo de Souza mudaram-se de Assaraí para Aimorés, passando por Mutum. Segundo relatos que contaram para o nosso entrevistado, ele ficou em Mutum, por ter adoecido, aos cuidados dos seus avós, Olívio Araujo e Dona Cotinha, até que tivesse condições de voltar para a companhia dos seus pais. O que nunca mais aconteceu. Em Mutum ele seguiu morando até concluir o Segundo Grau. Indo para Belo Horizonte em 1966. Em Mutum ficou conhecido pelo apelido de Buté.
 
Em 2007, José Araujo de Souza sentiu-se honrado em ter Travessia lançado e exposto para vendas ao público no Stand da Oficina de Livros, durante a realização da XIII Bienal do Livro, no Rio de Janeiro.
 
Sua literatura é produzida cotidianamente, não tem um escritor de referência. Suas obras são solos. Já até produziu em outros campos da arte, mas apenas para fins didáticos quando lecionava. Mutum está presente em outros textos além de Operação Mutum como no Poema dedicado à terra do seu Coração
 
MUTUM
 
Há um pedaço de dor
encravado entre as montanhas
desenhadas contra o céu
(ainda será azul?)
e um rio nascendo dos olhos
formando na queda a cachoeira.
(ainda será fria e funda?).
 
Há um começo vermelho de noite
correndo ao encontro do encanto da lua.
(ainda será dos namorados a velha rua?)
 
Há no peito embrutecido uma suave saudade
e um coração ferido comandando o sangue
que flui para o corpo.
 
Lá, por certo, o tempo se incumbiu
de sucumbir tudo.
 
E ninguém mais se lembra de olhar
a montanha encantada e pedir um querer
de madrugada.
 
Nem flutua no rio a escura canoa
e nenhum menino desafia mais o remanso
ao entardecer.
 
Por certo, só existe a saudade que sinto de Mutum.
 
 
ENTREVISTA
(Entremeada com parágrafos de SOLIDOR, de autoria do entrevistado)
 
Qual a sua relação sentimental com Mutum? Você tem parentes aqui?
Eu sempre digo que sou mutuense. Desde que me entendo por gente, sou mutuense. Eu só vivi fora de Mutum, antes de vir para Belo Horizonte, por dois meses após ter nascido em Assaraí. Fui registrado lá. Sou, portanto, mutuense nascido em Assaraí. Digamos que, na dúvida entre o local onde nasci pertencer geograficamente a Ipanema ou a Pocrane, escolhi ser de Mutum, onde sempre vivi.
Tenho em Mutum meu querido irmão Olívio de Souza Araujo, Olivinho. O mais velho dos meus irmãos. Também tenho primos. A família Araujo é muito grande.
 
“Solidor é a solidão nascida de uma dor de não se ter mais. Surgida como por encanto, no final de um sonho, no começo de uma noite de chuva ou, até mesmo, na hora da morte. É a falta permanente ou passageira deixando marcas e maracás em cada batida surda do coração. É o vermelho do sangue correndo pelas veias dilaceradas, num contínuo fluir e refluir, pelo corpo cansado.”
 

Qual a sua formação e atuação profissional?
Minha formação profissional foi toda direcionada para o Magistério. Fiz o Curso Normal em Mutum, no Colégio Normal Dionísio Costa (grafado com i). Fui o primeiro homem a fazer o Curso Normal em Mutum. Eu era o único homem em uma sala de mulheres maravilhosas, a quem devo a conclusão dessa etapa. Sem a ajuda que tive delas, eu não teria conseguido concluir o curso. Fiz o Curso Superior de História na UFMG.  Depois, Pós Graduação em Metodologia do Ensino Superior. E, finalmente, fiz Mestrado em Educação. Lecionei em todos os três níveis de ensino. Primeiro e Segundo Graus, Superior e Pós.
 
“Solidor é fruto da paixão, desespero, vingança e ódio. É resultado de um amor. Um poema inacabado por falta de espaço no papel. Uma canção cantada baixinho, no ouvido direito da amada. É um lamento, um suspiro ou um nome soprado baixinho a se perder no vento. No nada.”

 
Como e quando foi seu interesse pela literatura?
Comecei a ler muito cedo.  Revistas em quadrinhos. Minha mãe era professora, então não faltavam material para leitura. De Monteiro Lobato a Jorge Amado. Na casa dos meus avós morava um médico, Dr. Bião, que me "mandava" sempre ler algumas revistas técnicas variadas, que assinava especialmente uma: Seleções de Raeder's Digest. Tinha de tudo. Contos, poesia, novelas, piadas, artigos científicos, enfim, uma verdadeira enciclopédia. Como era poliglota, o Dr. Bião insistia para que eu lesse algumas de suas revistas em outras línguas. O que eu não conseguia e me frustrava. Não sei, exatamente, quando comecei a escrever mas sei que sempre gostei.
 
“É solidor a saudade de não se estar mais na cidade natal. Ou quando se perde um pedaço da vida na morte de alguém. Quando, de um lugar qualquer distante no tempo, repentinamente, ressurge o cheirinho gostoso de comida caseira, feita pelas mãos da mãe que já não temos mais.”
 
 
Quando surgiu a ideia de escrever Operação Mutum?
A ideia me veio ao ler notícia de que os Estados Unidos assinaram um acordo com a Espanha, assumindo o compromisso de descontaminar a área atingida por bombas deixadas cair por um avião militar, em um acidente aéreo ocorrido em 1966, em Palomares, no sul da Espanha. Cinquenta anos depois, a população ainda continuava sofrendo os riscos de radiação. Imaginei, então, como seria se acontecesse a mesma situação em uma região montanhosa como a de Mutum. E fui criando a história na minha cabeça. Os personagens foram nascendo e o enredo sendo desenvolvido. Usei imagens da minha infância. Quando criança, muitas vezes fiquei olhando para o céu, altas horas da noite, acompanhando o piscar de luzes dos aviões que passavam sobre Mutum, vindo de não sei onde e indo para algum lugar desconhecido. Faziam parte dos mistérios da minha infância. Assim, apenas criei situações que imaginei para dar forma a uma história fantasiosa que já tinha começo meio e fim na minha cabeça.

 
“Solidor é chocolate escaldado em fogão de lenha. Bala de coco redondinha coberta de açúcar. Bola de meia rolando na poeira. Enchente de rio manso. Gabiroba do mato. Manga espada com terebentina na casca. Goiaba vermelha. É tristeza.”
 
 
Você tem outras publicações além de Operação Mutum?
Escrevi e publiquei outros livros. TRAVESSIA; CONSENOR; CANÇÃO PARA JULIANA; PELOS CAMINHOS DO TEU CORPO; DELES E DELAS; DELES; DELAS; MALDÍVIA; CONTOS ERÓTICOS DE QUALIDADE; OPERAÇÃO MUTUM; O LEÃO DE JUDÁ. São contos e poemas, contos eróticos e romances de ficção.
 
“Solidor é boneca de pano, rasgada, deixada num canto de um quarto. É calor de colo. Carinho de mão tocando de leve nos cabelos. Caminho de roça, cheio de mato. Preguiça gostosa de depois do almoço. Brinquedo de infância. É brincar de pique. É balanço. É cobra cega. Casamento de jeca. Pipoca. Balão aceso no céu. Lua cheia. Carnaval de rua. Banco de escola primária. É trança de menina. É Igreja na praça. Refresco de canudinho. Caldo de cana tirado na hora. É barquinho de papel descendo na enxurrada.”
 

Como é a sua rotina de produção literária?
Tenho um computador instalado no meu quarto. Assim, gosto de escrever quando a vontade me pega, sem um horário preestabelecido. Quase sempre, tenho mais de um trabalho começado, inacabado e arquivado à espera de que eu o termine. Não escrevo com um tempo determinado para concluir o que comecei. O certo é que posso acordar no meio da noite e dar sequência a alguma coisa que já comecei a escrever e deixei num arquivo qualquer. Ou posso, simplesmente, começar alguma coisa nova.
 
“Solidor é palavra inventada, que nunca esteve em dicionário. Mas que existe viva dentro de cada um de nós. É a saudade danada de uma coisa que incomoda. Mas que não queremos perder nunca, nunca, nunca..."
 

Fale sobre Travessias e quais são os projetos literários para o futuro?
O Projeto Travessia tem como objetivo distribuir gratuitamente, através das redes sociais, 10.000 (dez mil) exemplares em PDF, dos livros digitais de minha autoria, com versões em Português, Inglês e Espanhol. Esta é uma forma que encontrei de facilitar a vida das pessoas que se encontram em casa, impossibilitadas de manterem convívio social até com parentes mais próximos, por causa do risco de contágio com o COVID-19, essa praga que está dizimando grande parte da população mundial. Procuro deixar com essas pessoas os meus livros, para que possam ocupar um pouco mais do tempo ocioso que terão. Ler é uma boa forma de passar o tempo. Enquanto eu as ajudo, elas, em troca, me fazem mais conhecido.
Estou, no momento, concluindo mais dois livros. Ainda sem títulos. Um de poemas. O outro, de faroeste, uma história envolvendo bandidos e mocinhos no Oeste americano, mais precisamente no Estado de Nevada. Lá pelos idos de mil novecentos e pouco. Já estão bem avançados, mas sem prazo estabelecido para terminar. Vou caminhando, na velocidade que o tempo das histórias exigir.

***

O blog Mutum Cultural agradece ao escritor José Araujo de Souza por nos conceder tão enriquecedora entrevista.


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